segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Infância querida?


Infância querida?



Vir ao mundo foi doloroso, minha mãe queria um menino, chorou.

Quando bebê tinha fome de leite materno. Ganhei mamadeiras com leite de vaca engrossadas com Maizena.

Adorava os encontros em família, aniversários, Natal, dia dos Reis Magos. Mudamos de pais.

Em uma escola, em São Paulo, lembro-me de uma professora cruel. Eu mal sabia falar a nova língua, levantei meu braço e pedi para ir ao banheiro. Fui ouvida, mas o pedido foi negado. A bruxa me deixou sem opção, em plena sala de aula fiz pipi nas calças. Ainda lembro-me da dor, do sofrimento, da minha cabeça abaixada, escondida entre meus braços cruzados na carteira escolar querendo me esconder. Quanta vergonha! Ainda sinto o choro soluçante, a urina quente escorrendo pela minha saia, minhas pernas, meias soquete, sapatos e finalmente o charco no chão. Ainda faltava pegar o bonde para voltar para casa, não sabia o que fazer, estava toda molhada. O meu irmão? Este se distanciou, eu o envergonhara, fingiu não me conhecer.

Eu sempre era motivo de chacota, debochavam das minhas roupas, do meu jeito de agir, falar ou do meu corpo gorducho. Eles sempre encontravam um motivo para me excluir das brincadeiras e humilhar. 

Um dia depois da saída, fui expulsa de dentro da escola, pois já tinha passado a hora de fechar. Deixaram-me sozinha na calçada. Lembro-me dos portões enormes de grade fechados, de escurecer, do medo, do frio, da fome e nada da minha mãe aparecer. Andava de um lado para o outro sem saber o que fazer, não tinha dinheiro, e mesmo que tivesse, não saberia qual era o bonde que tinha que pegar. Em um belo momento ela finalmente apareceu, simplesmente pediu desculpas, disse que estava estudando com meu irmão e me esquecera.

 Chega! Eu pulo esta parte e muitas outras também.

Não quero relembrar mais nada. Será que minha memória falha? Quanto mais me esforço para lembrar mais dor eu sinto.

Onde está a minha infância que tinha que ser querida?

Covardes de uma figa, eu só queria me sentir amada.

Como foi o prazer de me tratar como um ET?

Passei por uma infância triste, excluída, fiz-me adolescente, e adulta quase sozinha.

Covardes, mil vezes covardes, só me amaram no fim da transformação. Orgulhavam-se no que eu tinha me transformado, como se eu fosse obra deles. Ridículos!

Creio que Deus e uma legião de anjos me protegeram e ainda protegem.

É claro que existiram momentos felizes em minha vida, só que se perdem no meio de tanta podridão.

Estou consciente de que outras pessoas vivenciaram coisas muito piores, sobreviveram com garra e vivem suas vidas com naturalidade e alegria.

A pergunta que não quer calar é por que me pediram para lembrar e escrever sobre a minha infância?

Deve ter sido para me dar a certeza de que Deus existe e que está sempre de plantão.
                                                                                                     Viviana Moreira
                                                                                                                   

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